Almanaque das drogas | Vamos falar de drogas?
“Esse é objetivo do livro. Ele não quer incentivar nem demonizar o uso de substâncias psicoativas, não quer defender a legalização nem a proibição de nada. Quer apenas desmistificar as drogas, oferecer informações sobre elas e ajudar o leitor a tirar suas próprias conclusões sobre o assunto. Quem sabe assim as mentiras não se espalhem tanto”.
Assim Tarso Araujo, premiado jornalista, apresenta seu ALMANAQUE DAS DROGAS, que como seu subtítulo diz é um guia informal para o debate racional.
Por mais que a população saiba o que é a droga, por mais que o governo incentive a troca de informações sobre o assunto entre pais, filhos e amigos, o tema ainda é pouco e mal explorado. A presente obra pretende dar um passo a esta maior compreensão e abordar todas as questões para um debate mais rico.
Esta Observação abordará pontos centrais do livro obedecendo a divisão estabelecida pelos capítulos.
O BÁSICO
“Neste livro, vamos usar a palavra ‘droga’ como sinônimo de droga psicoativa, isto é, aquela capaz de causar alterações de comportamento e/ou percepção, independentemente de seu status legal. E essas serão as drogas que vamos abordar”.
A seguinte definição proposta pelo autor é justificada pela falta de consenso em torno da palavra ‘droga’. Os farmacologistas, segundo Araujo, consideram droga qualquer substância capaz de alterar o funcionamento normal de um organismo. Aqui, Aspirina e chá de camomila, por exemplo, estariam no mesmo grupo que maconha e cocaína.
Já a Organização Mundial da Saúde (OMS) as define como substâncias que afetam a mente e os processos mentais. Mas há certa confusão aqui, uma vez que tal informação consta em um manual da instituição chamado Glossário de Álcool e Drogas, logo álcool seria uma outra classe e não droga.
Importante observar que o autor também destaca em seu texto drogas legais, como cafeína e tabaco, e seus efeitos nas pessoas (muitas vezes mais nocivos do que pensam).
HISTÓRIA
Sabia que todos os povos desde a Antiguidade de uma maneira ou outra produziram drogas para consumo? Sabia que a receita mais antiga que existe (encontrada entre os vestígios dos sumérios, que viveram na Mesopotâmia por volta de 8000 a.C.) ensina a fazer cerveja?
“No último milênio antes da Era Cristã, o conhecimento sobre o uso de drogas já era tão sofisticado que os gregos foram capazes de identificar e compreender o fenômeno da tolerância, comum no uso de drogas psicoativas”.
Talvez o trecho mais curioso do capítulo seja a menção a história de uma famosa bebida consumida até os dias de hoje: “No Novo Mundo, (o Vin de Mariani, bebida muito vendida no século XIX que continha cocaína em seu conteúdo) inspirou cópias, como o Pemberton’s French Wine Coca. Como o país já enfrentava alguns protestos contra as bebidas alcoólicas, seu inventor, o farmacêutico John Pemberton, mudou a fórmula alguns anos depois. Ele abandonou o vinho, misturou a coca com um xarope de noz-de-cola e lançou a Coca-Cola, com o slogan ‘a bebida dos abstêmios’ – apesar de a cocaína permanecer em sua fórmula até 1909”. Importante dizer que isso aconteceu em um período onde os efeitos da droga não eram conhecidos a fundo.
Interessante também a citação às várias tentativas de proibir as drogas, entre elas o álcool, e também como a cafeína e o ópio levou britânicos e chineses a não apenas uma, mas duas guerras entre 1839 e 1860 (onde uma das consequências foi Hong Kong ter ficado nas mãos dos ingleses até 1997).
ECONOMIA
“Mercados de drogas são muito rentáveis, e a margens de lucro no comércio ilegal é ainda maior que no legal”. Tal frase justifica o porquê de grandes grupos de vendedores de drogas sempre surgirem, e também porque vale a pena correr tantos riscos.
Segundo Tarso Araujo, o mercado legal de drogas (álcool, cafeína e tabaco, principalmente) fatura pelo menos 1 trilhão de dólares por ano. Entretanto, é importante mencionar que, por ser legal, lida muito fortemente com algumas questões que as ilegais podem dispensar, tais como maior concorrência, lobbies com governo (afim de reduzir impostos e imposições contra o uso) e propaganda. O marketing e a publicidade, vale dizer, sempre foram mecanismos muito utilizados por essas empresas. A associação com os esportes (futebol, Fórmula 1) tende a ter apelo mais jovial, segmento que historicamente impulsionou a indústria.
Já o mercado ilegal sobrevive com os grandes cartéis, dominados por traficantes que ganham muito dinheiro com sua produção barata e alta rentabilidade na distribuição. Em contrapartida, os pequenos varejistas são em sua maioria pessoas de classes baixas (muitas vezes moradores de favelas) que entram no ramo por falta de oportunidades melhores dentro da comunidade onde vive. Além de faturarem pouco com a venda.
SAÚDE
Muito se pergunta sobre o porquê de alguém começar a usar drogas. O livro lista algumas delas: para esquecer problemas, para se divertir, porque os amigos usam, para adequar seu comportamento a algumas situações, para ter novas experiências, para melhorar a performance, para se medicar, para ir contra as regras, para relaxar e por motivos religiosos. O fato é que o motivo varia de pessoa para pessoa.
Assim como varia também a maneira de se consumi-las. Pode se fumar, inalar, cheirar, comer, beber e injetar. Cada maneira levará a uma consequência diferente para o corpo humano, pode afetá-lo rapidamente ou lentamente, causar certo efeito que de outro jeito não causaria.
“Muitas pessoas não entendem por que um viciado não consegue largar sua droga mesmo quando se arrisca a perder dinheiro, emprego e família, ou até mesmo a própria vida. É como os dependentes químicos serem considerados pessoas burras, entre outros adjetivos. Esse juízo mostra quanto a dependência química ainda é um mistério para o senso comum”.
POLÍTICA
“Legalização, proibição, descriminalização. Essas são as palavras-chave dos debates sobre drogas e se referem às diferentes opções que os governos têm para tratar quem vende e quem usa essas substâncias”.
Como atesta Araujo, apenas há pouco tempo a discussão em torno das drogas alcançou uma amplitude global. Coibir ou não o comércio e o uso de drogas? O autor estabelece todos os parâmetros comparativos entre cada uma das alternativas, listando exemplos históricos para cada um deles.
“Antes de escolher como controlar as drogas, é preciso definir o objetivo do controle”. Eis um grande problema. Os Estados Unidos, maiores investidores da guerra contra o crime não possuem resultados concretos que justifiquem tamanho gasto neste segmento. Ao aumentar o número de prisões de usuários de drogas, ampliaram em 127% seus gastos com o sistema carcerário em 20 anos. Ao passo que a educação universitária apresentou aumento de ‘apenas’ 21% no mesmo período.
DROGAS DE A a Z
Tudo que você sempre quis saber sobre cada droga: o que é, qual a duração, os riscos, dependência, histórico e como é feita. Precisa dizer mais?
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tive uma professora uma vez que me disse que o valor de uma obra se vê pela bibliografia utilizada. Tarso Araujo aponta em seu Almanaque das Drogas nada menos que trinta páginas de livros, teses, revistas científicas utilizadas como apoio para sua obra.
Um segundo ponto importante é a forma como o autor nos conduz através do livro, fugindo e muito da burocrática escrita de almanaques e enciclopédias, normalmente procurados apenas para trabalhos científicos. Marques vai além, e nos educa sobre um assunto que pensamos conhecer, mas que na verdade pouco sabemos. O que só demonstra sua importância para o debate que vivemos no século XXI.
O autor também procura ficar aquém de uma opinião mais pessoal sobre o que fazer para reduzir o consumo. Deixando o leitor pensar por si só que caminho tomar.
Isso sem mencionar a belíssima edição produzida pela editora LeYa, com capítulos separados por cores, gráficos, tabelas e notas complementando a obra.
ALMANAQUE DAS DROGAS
Autor: Tarso Araujo
Editora: LeYa
Número de páginas: 384
Ano de lançamento: 2012
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