Os livros que devoraram meu pai | A vida seguindo pela literatura

“A vida, muitas vezes, não tem consideração nenhuma por aquilo que gostamos”.

Vivaldo era apaixonado por leitura, assim nos diz seu filho, narrador da história. Sua paixão o levava a fazer sacrifícios, loucuras em prol daquilo que tanto gostava. Lia livros escondido em sua repartição enquanto fingia trabalhar (“Não é uma atitude aconselhável, mas era mais forte do que ele”).

Um dia, no entanto, Vivaldo deixou este mundo.

Assim começa OS LIVROS QUE DEVORARAM MEU PAI, um conto tocante sobre o quão longe uma paixão pode nos levar.

E para onde esta Observação também pretende te arrastar.

CURIOSIDADE DE MENINO

Ora, bolas, deixei de apresentar nosso protagonista-narrador!

Deixe que eu conserte meu erro. Elias Bonfim não chegou a conhecer o pai, sua mãe ainda encontrava-se grávida quando ele abandonou este mundo.

Ah, e quando falo ‘abandonou este mundo’, como bem nos explica nosso jovem contador de histórias, não digo ‘abandonou este mundo porque morreu’. Simplesmente, abandonou este mundo. “É a verdade objetiva, como você vão perceber. Sem qualquer figura de linguagem”. No dia em que ‘sumiu’ lia A Ilha do Dr. Moreau, de H. G. Wells.

A história de Elias começa ao completar doze anos. Aparentemente, seu pai sabia o que estava para lhe ocorrer, pois dias antes de desaparecer deixou um recado à sua mãe, pedindo que guardasse sua biblioteca até que achasse que o neto dela tivesse pronto para ela. Portanto, o presente de Elias dado por sua avó em seu décimo segundo aniversário foi uma chave e a história de seu pai.

“Uma biblioteca é um labirinto. Não é a primeira vez que me perco em uma. Eu e meu pai temos isso em comum. Penso que foi o que lhe aconteceu. Ficou perdido no meio das letras, dos títulos, perdido no meio de todas as histórias que lhe habitavam a cabeça”.

EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO

Apesar de ter em mãos o fatídico A Ilha do Dr. Moreau, não foi por este livro que enveredou pela leitura. “Percebi que deveria começar devagar, por outros volumes, em vez daquele livro falta que devorara meu pai”. Mas o encontro era inevitável.

Enquanto isso, no ‘mundo real’, somos apresentados a dois personagens importantes para o final da trama: Beatriz (“ela era a matéria mais volúvel da escola, mais do que qualquer matemática, qualquer divisão de orações”) e Bombo (seu amigo obeso, alvo de violência e insulto na escola).

A história de Elias começa a ganhar complexidade quando, ao iniciar o livro de Wells, segue o rumo de seu pai e adentra a história relacionando-se com os personagens. A partir dali, empreenderá uma saga em busca do progenitor, viajando entre livros.

Tudo que move a vida de Elias, a partir de agora, parece ter ligação com a literatura, e isso vale desde uma analogia a raiva de sua mãe por chegar muito tarde para o horário do jantar (“Não gritou, não citou Dostoiévski ou qualquer outro escritor russo, mas crivou-me de palavras profundas, daquelas que parecem garfos”), até como melhora de sua timidez para finalmente conseguir conversar com a garota que gostava (“No dia seguinte, no intervalo entre as aulas de Matemática e Desenho, reuni coragem suficiente para falar com Beatriz. O motivo que me levou a fazê-lo foi ter passado os olhos por um livro chamado Divina Comédia).

Mas tirar um pé da realidade pode ter um risco.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Nossa mente é estranha. Por vezes não vê o óbvio, sr. Bonfim. Não vê o que está, o tempo todo, na nossa frente”.

Não espere aqui saber o final do livro. Leia ele!

Posso dizer, no entanto, que Os livros que devoraram meu pai é um livro de muito ensinamentos a se tirar. E se a ideia aqui é deixa-lo intrigado, digo-te que até como mudar nosso passado no mundo real nós aprendemos.

Elias viaja por mundos muito além do nosso, mas esbarra na vida real, com um desfecho aterrador, mas marcante “porque um homem é feito de histórias, não é de DNA e músculos e ossos. Histórias”.

Seu pai talvez tivesse feito o mesmo em sua jornada, mas ao fim, você vai entender que talvez não o fizesse para empreender um feito pessoal, talvez visasse que seu filho um dia seguiria seu caminho.

E é através de obras de H. G. Wells, Stevenson (O Estranho Caso do Dr. Jekyll e do Senhor Hyde), Dostoiévski (Crime e Castigo) e Bradbury (Fahrenheit 451) que suas vidas se entrelaçam. E, quiçá, as nossas.

OS LIVROS QUE DEVORARAM MEU PAI: A ESTRANHA E MÁGICA HISTÓRICA DE VIVALDO BONFIM
Autor: Afonso Cruz
Editora: LeYa
Páginas: 112
Ano de lançamento: 2011

4 comentários:

  1. no final do livro "os livros que devoraram o meu pai" o rapaz encontra o pai?

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    1. Poxa, não posso contar o final, é meio injusto com quem não leu o livro. Mas leia, acredito que vai gostar. Abraços e obrigado pelo comentário!

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  2. Estou lendo-o e por enquanto estou gostando.

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